Logo que o carro deles estacionou na frente da casa, assim que os pais dela saíram, os dois entraram rápidos e sem falar muito, a porta se fechou com uma batida as suas costas. Em menos de dez minutos ela gemeu alto, um quase balido, vindo do fundo de sua alma. Percebi que ela não transava a semanas, tal o seu griteiro. Haviam se passado menos de vinte minutos quando ela começou uma nova sessão de gemidos, agora frenéticos e ansiosos, urrava como uma onça no cio, curioso subi em uma cadeira e acessei a janela no muro que divide nossos pátios e pude vê-los na cama: Ele dormia virado para a parede, ela se masturbava com sofreguidão, saliva escorrendo pelo canto da boca, gozando como uma cadela, a colcha azul claro empapada com seu líquido viscoso, os lábios entreabertos, o cabelo desgrenhado e volumoso grudado no suor. Aquele babaca mal conseguira dar uma foda, se fodia a semana inteira naquela oficina de merda, estava exausto.
sexta-feira, 22 de setembro de 2017
sábado, 16 de setembro de 2017
O Astronauta no Celeiro
Entrei por um velho portão de
madeira de cerca de um metro e meio de altura, as dobradiças rodaram nos eixos
sem ranger, mostrando que estavam bem engraxadas. As madeiras velhas e fortes
não mostravam nenhum traço de apodrecimento, um cachorro me olhou assustado e
voltou a dormir enrodilhado na sombra de um antigo cinamomo carcomido pelo
tempo.
Segui por uma trilha sinuosa no
meio do capinzal, os pedregulhos do chão pareciam crocantes no solado das
minhas botinas, muitas laranjeiras cercavam todo o caminho. Passei por uma
antiga casa em estilo colonial muito simples, grande ela tinha as paredes bem
caiadas que brilhavam ao sol com a alva característica da cal. Mais adiante me
deparei com outra construção, essa de madeira, também muito grande e alta, com
as tábuas das paredes dispostas de forma horizontal e longitudinalmente, no
estilho americano de construir, parecendo um antigo celeiro, ou galpão de
estância. Uma das folhas da porta entreaberta balançava suavemente com a brisa
morna daquela tarde quente, pela grande fresta pude ver uma velha maquina na
sombra. Ouvi um som de música e continuei, dando mais uns passos. Em uma sombra
projetada pela alta cumeeira daquele galpão, um homem trabalhava debaixo de um
velho trator, manejando com destreza uma enorme chave inglesa, tendo a seus pés
um banquinho com um rádio tocando uma música suave, a qual ele acompanhava
assoviando, enquanto trabalhava. Fiquei a observar a cena, quando subitamente a
peça em que ele mexia se soltou e foi seguida por um jato de óleo queimado que
quase atinge seu rosto. O homem com agilidade afastou-se de lado ao mesmo tempo
em que aparava o líquido viscoso com uma espécie de recipiente de lata,
colocando-o exatamente na direção de onde o liquido se esvaía. Feito isso se
arrastou sem dificuldades para fora, levantando-se com igual agilidade, nisso
percebi que era bem velho, apesar da jovialidade dos gestos. Olhou-me um pouco
espantado, a longa franja do cabelo escasso, vermelha soprou com o vento
revelando a tez queimada pelo sol, gotas de suor empapando a testa enrugada e
judiada pelo tempo. Estendeu a mão com um sorriso leve e cordial, retribuí.
_Olá! Meu nome é Iuri, com “I”, é
mais fácil de escrever do que com “Y”. Disse.
_Boa tarde, Procuro por uma peça
de metal, que possa servir como grelha, ou um disco que possa ser levado ao
fogo para fritar ou cozinhar carnes, indicaram-me seu estabelecimento. Ele riu.
_Estabelecimento? É apenas minha
casa e minhas bugigangas e velharias como eu. Mas siga-me, vamos ver o que
achamos.
Seguiu em frente com passos
largos e firmes, os sapatos rotos fazendo rodilhas de poeira no chão batido e
estorricado, eu o seguia com dificuldade, observando sua sombra se deslocando
no gramado irregular que ladeava o caminho. Chegamos a um depósito cercado, mas
com um a entrada livre onde havia muitas peças de ferro-velho e uns dois
automóveis semi desmontados. Em um dos lados observei um grande objeto,
cilíndrico e cônico, como uma enorme maquina de lavar dessas antigas, com
aquela abertura circular típica, por onde poderia passar sem muito sacrifício
uma pessoa. Dentro pude observar que havia uma espécie de “cockpit” em frente a
um painel com diversos furos, de onde parece que haviam sido retirados diversos
instrumentos eletrônicos, ficando apenas pontas de fios e marcas de pancadas. Perguntei-lhe:
_O que é isso?
_Uma das bugigangas que a mãe pátria me deu quando me mandou
para a América do sul, disseram que era um presente e o pagamento pelos meus serviços
prestados.
Pendurado em um lugar daquela coisa, pendia um capacete com
a sigla C.C.C.P, e logo abaixo em caracteres menores as letras Y.G. sublinhadas
e com uma patente que não soube traduzir. Espantado balbuciei:
_O senhor é... digo... seu nome...
_Isso meu jovem, sou o velho Yuri Gagarin.
_Mas... mas... Gagarin não morreu em 1968?
_Sim. Na mãe pátria, sim.
Disse contendo um espirro, em seguida deu um largo sorriso mostrando os dentes fortes e amarelados, a franja vermelha soprou com o vento, me alcançou uma peça de ferro enferrujada parecida com uma bateia de garimpo e completou:
Disse contendo um espirro, em seguida deu um largo sorriso mostrando os dentes fortes e amarelados, a franja vermelha soprou com o vento, me alcançou uma peça de ferro enferrujada parecida com uma bateia de garimpo e completou:
_Isso serve? Perguntou, me olhando com sinceridade. Seus profundos olhos azuis me pareceram a terra quando vista do espaço.
sexta-feira, 8 de setembro de 2017
domingo, 3 de setembro de 2017
Relógio de Sol
“Os anos mudam as nossas opiniões, da mesma forma que alteram a nossa fisionomia.”Marquês de Maricá
Naqueles
dias, as tardes eram tão longas que parecia que o dia nunca ia acabar, mas
acabava, pois ansiava pela chegada da noite e os seriados e filmes da
televisão.
Marú e eu tínhamos uma amizade imensa, na qual
compartilhávamos todas as atividades do dia a dia: estudo, brincadeiras,
bicicletas e todas as invencionices que a juventude permite. Em muitas
atividades, sobretudo aquelas mais perigosas, tínhamos a consultoria e
assistência de seu pai, que nos ajudava a fazer brinquedos, ferramentas e nos
indicava lugares onde achar materiais e livros nos quais pesquisar. Não passava
um dia sequer sem que criássemos alguma coisa, nem que fosse um projeto, um
desenho e sobre ele gastávamos horas a fio discutindo, melhorando e divagando
sobre as possibilidades do invento, ou brincadeira. Nos finais de tarde,
cansados nos sentávamos a sombra de um velho e carcomido cinamomo no pátio, ou
então em um velho sofá na garagem mergulhávamos na leitura das inúmeras
enciclopédias do seu pai, revistas e livros que em volume crescente iam saindo
de dentro da casa e ocupando um grande cômodo da garagem, muito iluminado e
aquecido pelo sol, ideal para os dias de inverno. Foi num dia desses, bem
ensolarado que observamos através das frestas das tábuas brutas da parede, que
as réstias de sol projetadas no assoalho se movimentavam à medida que as horas
iam passando, seguindo sempre na direção oposta a trajetória que o sol fazia lá
fora. Tivemos a idéia de fazer marcas no assoalho, primeiro com lápis, depois
com tinta. Escolhemos um dos fachos de luz, o que mais tempo alcançava e de
hora em hora em traçávamos uma linha longitudinal na linha divisória entre a
luz e a sombra. Depois a cada dia íamos subdividindo essas marcas, em meia
hora, um quarto de hora e pequenas divisões a cada minuto. Essas últimas se
tornaram mais imprecisas, devido a minúcia que deveriam ser traçadas. Depois
percebemos que através desse “relógio” tosco, podíamos prever com exatidão o
soar de uma sirene a vapor de uma fábrica perto e também à hora em que a mãe de
Marú nos chamava para o lanche da tarde, era infalível e passamos a viver quase
que exclusivamente de sincronizar acontecimentos temporais diários com o nosso
marcador de tempo. Dessa forma passamos todo o período das férias escolares,
sendo que as vezes o pai de Marú passava para perguntar as horas e “acertar”
seu velho relógio de pulso, um Tissot, Suíço de mais de trinta anos, imagino
que aquele relógio precisasse muito do nosso para andar na linha. Por essa
época notamos que com o passar das estações, as marcações que tínhamos feito
não se alinhavam tão justamente com as réstias de luz e logo percebemos que a
posição do sol devido a rotação da terra ia alterando nossas marcas, as horas
já não eram indicadas com a precisão das primeiras semanas, e logo que o outono
chegou as horas estavam completamente fora de sincronia, precisamos atualizar
os riscos, o que gerava uma nova série de marcas sobrepostas que confundiam a
aferição. Quando as férias escolares de inverno chegaram, nosso envolvimento
com o assunto relógio de sol tomava grande parte de nossas conversas e em
determinado momento chegamos a conclusão de que precisávamos de um relógio que
levasse em consideração as estações do ano e as posições alternadas que o sol
ia tomando ao longo delas. Estávamos crescendo e amadurecendo nossa maneira de
perceber as coisas, o relógio de sol, vejo agora com a distância dos anos,
permitia até mesmo esse tipo de aferição, pois na medida em que o experimento
cobrava maior aprofundamento e resolução dos problemas, éramos impulsionados a
resolvê-los e dessa forma evoluíamos juntamente com nossa criação.
Os dias passavam com peculiar lentidão quando não nos
reuníamos para tratar de nosso relógio, e as tarefas mais corriqueiras do dia
se tornavam um suplício, quando não relacionadas a isso. Por esse período Marú
começou a enfrentar problemas familiares, devido as suas faltas freqüentes as
aulas. O colégio parecia não lhe interessar mais, visto que passava as manhas
inteiras em um “autorama”, um pequeno estabelecimento que oferecia uma enorme
pista de corrida com ótimos carrinhos elétricos de fórmula 1. Nosso projeto do
relógio do sol, também estava indo de forma mais lenta, mas sempre que eu ia na
casa de Marú, fazíamos desenhos e projetávamos alguns designs possíveis para o
projeto. Essas reuniões passaram a não ser tão agradáveis, pois os seus pais estavam
reprovando o seu comportamento escolar e deixaram de incentivar o projeto do
relógio de sol. Até mesmo os convites freqüentes para almoços de domingo com
eles cessaram, eles estavam me olhando com outros olhos, talvez percebendo
alguma influência que eu tivesse nas escolhas de Marú. Não havia nenhum tipo de
influência que não as correlatas ao nosso projeto, pois eu era assíduo nas
aulas e muitas vezes reprovei Marú por seu comportamento. No verão que sucedeu
as férias de inverno daquele ano, nós começamos a nos afastar por diversos
motivos. Nossos outros interesses começaram a divergir de forma um tanto
vertiginosa, com Marú preferindo as saídas noturnas, que eu ainda não podia
acompanhar, já que era mais novo e eu tendendo a me envolver com as garotas da
minha faixa etária e com a curtição de discos de rock, que vinham de maneira
muito profunda influenciando meus amigos, incrivelmente Marú não embarcou nessa
viagem. No ano seguinte não mais nos falamos e Marú mudou de cidade, ficando
apenas a casa grande madeira onde moravam. Essa casa se preservou quase que da
mesma forma, habitada por diversas outras famílias por mais de quarenta anos,
vindo a ser demolida somente a pouco mais de cinco anos, época em que voltei a
fazer contato com Marú através das redes sociais, mas de forma diferente e mais
distante do que antigamente, nem sequer tocamos no assunto “relógio”, que antes
tão importante, agora apenas fazia parte da miríade de lembranças que nossa
memória regulamente regurgita conforme aprofundamos nossa nova interação.
Naqueles tempos da juventude e de nosso projeto de relógio de
sol, Marú e eu tínhamos escolhido uma grande pedra que existia no seu quintal,
grande mesmo, de cerca de um metro de altura e uns quatro de diâmetro aparente,
e havíamos esculpido com cinzel e marreta no seu topo, um grande círculo do
tamanho de um prato, que viria a ser uma das fases do nosso relógio de sol, e
que ficou inconcluso para sempre. Um grande sulco, profundo o suficiente para
perdurar enquanto a grande pedra durasse.
Quando fui trabalhar em uma construtora da cidade, soube que
o terreno onde era a casa de Marú foi adquirido e que lá seria construído um
grande prédio de apartamentos, tirei uma tarde e desci até o local. Tudo em
volta estava igual, as duas ruas da esquina, o colégio e o casario, tudo
igual, não ser pelo novo pavimento das
ruas, que agora era de asfalto, feito em
cima dos velhos e brilhantes paralelepípedos de outrora. O terreno estava
cercado por um grande tapume de obra, com o logo da empresa por toda a parte.
Acessei o portão principal, e de lá mesmo avistei a pedra, intacta, igual,
atravessando os anos e nossas vidas de forma indelével, inexorável como o
tempo. Me posicionei primeiramente, do lado oposto ao da cavidade onde havíamos
feito a escultura, tentando de alguma forma preterir aquele encontro, dizendo
para eu mesmo:
_Não, isso foi um sonho, não está lá...
Mas estava, um pouco diferente, mas estava, com liquens
ocultando parte do desenho tão simetricamente esculpido. Ouvi as risadas
daquele dia, senti o contato da brisa no rosto e vi o largo sorriso alvo de
Marú, seu cabelo preto crespo como uma bandeira tremulando no vento da
primavera e sua pele morena, saudável e viçosa a brilhar, com o suor escorrendo
pela testa. Lembrei do arroz branco de
dona Leda, sua mãe e do jeans novo que sua irmã desfilou um dia para nós. Vi o
carro da família na garagem e o cachorro Bobby pulando de um lado para o outro.
Senti até mesmo o calor daqueles dias de longas pedaladas e o cheiro das
revistas na estante da garagem. Eu vi a
vida a se derramar através dos anos e os caminhos que as vidas tomam. Bem como o
som dos pássaros no velho cinamomo e as risada grave e bem humorada do pai de
Marú. Quando dei por mim estava em lágrimas diante da pedra, absolutamente
comovido em saber, que o relógio de sol que projetamos funcionou, mesmo que de outra forma.
Assinar:
Postagens (Atom)