Sofro de um mal que já foi
diagnosticado há bastante tempo e, que se não me prejudica, muito pior auxilia.
Eu simplesmente sou incapaz de esquecer qualquer coisa, qualquer acontecimento
ou fato. Lembro de coisas e conversas ainda no útero de minha amada mãe, meu
primeiro bico, a cor de minhas roupinhas, sandálias, primeira professora,
namoradinha, brigas, palmadas, puxões de orelhas, doenças infantis, febres,
tudo. Posso esquecer o que comi no almoço, uma fórmula que aprendi ontem ou uma
receita culinária da televisão, mas, nada que tenha ocorrido a mais de alguns
meses. Isso não é fácil e requer paciência, cuidados no trato com parentes e
algumas noites de insônia. Meu neurologista, recentemente em uma consulta disse
ter boas notícias e, que minha "síndrome" (ele se refere a meu caso
dessa maneira) poderia estar com os dias contados. Concordei com os termos dele
e fiquei admirado com as novas descobertas da medicina neurológica que ele me
contou. Dos novos fármacos, exames e rotinas de tratamento. Após a última
consulta refleti e, apesar da noite ser má conselheira decidi não concordar com
a terapia. Bem ao acaso lembrei, como não poderia ser de modo diferente, do
filme "Blade Runner" (1982) de Ridley Scott. Nele, a personagem
principal, Rick Deckard, se envolve com Rachael, assistente de um cientista, e
descobre que ela é um andróide. Todas as lembranças que a andróide tinha em sua
mente não haviam sido experiências reais, tinham sido implantadas em seu
cérebro cibernético. A partir de então, Rachael vivencia uma crise existencial
decorrente de sua perda de identidade: de um momento para outro ela deixa de
ter certeza de quem ela é. Devido minha auto-estima, meu ego e minhas boas
lembranças, decidi não arriscar.
segunda-feira, 10 de junho de 2019
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